Ricardo Schütz
Fonte:
http://www.sk.com.br
O fenômeno popularmente conhecido como "tradução mental" é uma forma
de interferência da língua materna na língua alvo. A tendência de apelar para
traduções mentais é a atitude natural de toda a pessoa monolíngüe, ao se
deparar com uma língua estrangeira. A persistência deste hábito entretanto é
sintoma de que algo vai mal. Revela que o direcionamento, a estratégia de
aprendizado está errada.
O monolíngüe é aquele cuja mente só funciona nas formas da língua materna. O
aprendizado de uma língua estrangeira como inglês, por sua vez, consiste
essencialmente na eliminação da interferência da língua materna - no nosso caso
o português. Consiste na substituição das formas (pronúncia, vocabulário e
estruturas) do português pelas formas (muito diferentes) do inglês. Se
estivéssemos aprendendo espanhol ou italiano, poderíamos aproveitar muito da
nossa habilidade lingüística num processo mais de transferência e adaptação do
que substituição. Sendo entretanto inglês nosso objetivo, uma língua que
apresenta um nível de contraste muito mais acentuado em relação ao português,
seu aprendizado implica em reaprender a estruturar nosso pensamento, dessa vez
nas formas do inglês. Seria como que, parcialmente, reaprender a pensar.
Portanto, no caso específico de brasileiros aprendendo inglês, o método da
tradução prematura, assim como praticado no ensino médio, é contraproducente. O
mesmo erro pode ser observado também em cursos de inglês que transferem a idéia
da tradução para os exercícios orais dos estágios iniciais. Parece muito fácil,
mas vicia e direciona para o lado errado. Ensinar a traduzir rapidamente
poderia ser comparado ao ato de ensinar a andar de bicicleta em bicicleta de
três rodas.
O depoimento de Marília Conte Daros, uma professora de inglês que iniciou seus
estudos no Brasil, ilustra bem o problema:
In my case, I had a hard time becoming fluent in the second language because of
the interference of two factors. The first factor was learning strategy, which
was translating (L2 to L1 to L2 again) due the fact that my foreign language
classes focused on The Grammar Translation approach. It was a slow strategy
that caused me a lot of headaches and frustration. I spent a whole year
translating while I was an exchange student. The second interference was low
self-esteem, the belief of not being able to produce L2, due to the oppressed
education I experienced in undergraduate school in Brazil. Professors believed
that low grades reflect a hard school (meaning "good"), so nothing
was good enough. Undergraduate students got to graduation scared to use the
target language. (Disponível em:
http://pegasus.cc.ucf.edu/~gurney/LangConn.htm).
Este depoimento revela claramente não só o erro a que nos referimos, como
também a incapacidade do aprendiz em perceber o erro do caminho que lhe
apontaram. Se uma pessoa inteligente como a Prof. Marília levou anos para
perceber a ineficácia da metodologia que seguia, como é que nós, muitas vezes
profissionais de outras áreas, vamos conseguir avaliar o método de ensino que
nos promete milagres? Isto também demonstra a capciosidade do apelo comercial
de cursos que oferecem uma "aula demonstrativa".
Em resumo, a habilidade de se falar uma língua fluentemente, já exige nosso
cérebro ao limite. Não há cérebro humano que consiga processar duas línguas
simultaneamente. (O caso de tradução simultânea não serve como exemplo porque
quando tradutores-intérpretes atuam, eles não estão desempenhando
criativamente.) Por isso é que o bom aprendizado de inglês, desde o primeiro
dia de aula, não inclui a língua materna.